(Marechal Deodoro da Fonseca) |
Mas,
prosseguindo, já pelas três horas daquela mesma tarde, na presença de uns
poucos republicanos e de um reduzido número de basbaques apressadamente
reunidos pelos primeiros, na Câmara Municipal do Rio de Janeiro, ainda presente
o vereador José do Patrocínio, foi efetuada uma sessão e ali aprovada uma moção
lavrando-se ata, tudo alusivo ao evento militar, que foi levada ao Marechal
Deodoro em sua casa. Vale a pena reproduzi-la e com a grafia da época:
"Cerca
de 3 horas da tarde, chegou ao mesmo edificio o sr. vereador José do
Patrocinio, acompanhado do povo e immediatamente foi votada a seguinte
representação: "Exms. srs. representantes do exercito e da armada
nacionaes - Temos a honra de communicar-vos que, depois da gloriosa e nobre
resolução que ipso facto depoz a monarchia brazileira, o povo, por orgãos
espontaneos e pelo seu representante legal nesta cidade, reunio-se no edificio
da camara municipal, e, na fórma da lei ainda vigente, declarou consummado o
acto da deposição da monarchia e, acto seguido, o vereador mais moço, ainda na
forma da lei, proclamou, como nova forma de governo do Brazil, a Republica.
Attendendo ao que, os abaixo assignados esperam que as patrioticas classes
militares sanccionem a iniciativa popular, fazendo immediatamentae decretar a
nova fórma republicana do governo nacional".
Algo,
que tinha valor meramente político, embora fosse este bem pequeno, sendo de
duvidosa legalidade e ainda distorcendo a realidade. De qualquer forma, aquela
moção acabou sendo um dos ingredientes daquela salada feita as pressas, pois na
verdade o que se fizera na secretaria da guerra fora uma mera
"quartelada", com uns poucos republicanos presentes e sem nenhuma
influência nos acontecimentos, fora alguns elementos curiosos do povo apenas
observando a distância e com cautela a toda aquela movimentação anormal.
Mas,
de qualquer forma a pequena moção camarista apareceu naquelas horas tumultuadas
e por isto ingressou na história pátria. O principal mesmo foi que Deodoro,
tenha sido seriamente instado por vários camaradas militares, que temiam
futuras represálias aos oficiais rebelados da parte do estado monárquico.
Aventou-se, em especial, que naquele mesmo dia o desagradou profundamente a
menção ao nome de um velho adversário pessoal e político, como o futuro
presidente do conselho de ministros (o primeiro ministro da época), sendo ele o
prócer gaúcho, Gaspar da Silveira Martins, que estaria no momento em cogitação
na área palaciana imperial. E, ainda, que isto foi a última gota d'agua, que o
levou aquela decisão, o que aliás é perfeitamente crível, face a inimizade
capital entre ambos. Quaisquer, que tenham sido as razões ele acabou na noite
do dia 15 de novembro por concordar com a proclamação da república e assinou o
decreto número 01, em nome de um improvisado governo provisório, auto criado e
nomeado as pressas, fazendo nascer a república federativa e dando outras
providências para a dissolução do estado abolido.
Por
ai se vê, que a república foi feita em duas fases, sendo a inicial uma manobra
de demonstração de força totalmente militar, tanto que, na conclusão desta
perante o último gabinete de ministros do império e ainda na Secretaria de
Guerra, o velho marechal fez um emocionado discurso a Ouro Preto dizendo-lhe:
"Vossa Excelência e seus colegas estão demitidos por haver perseguido o
Exército". "Quanto ao imperador", concluiu, "tem a minha
dedicação, sou seu amigo, devo-lhe favores: seus direitos serão respeitados e
garantidos." Também afirmou na ocasião, que encaminharia uma lista de
nomes do futuro ministério a D. Pedro II. E de República, nada ele falou.
Mais claro, impossível!
E
a outra orbitada em interesses de facções, preconceitos e sentimentos pessoais,
anseios de poder de teóricos republicanos, uma pitada de política, tudo
finalmente formalizado de maneira meramente cartorial, mas sempre girando do
princípio ao fim em torno do velho marechal, face ao seu grande prestígio
perante as tropas da guarnição carioca, estando os poucos republicanos
brasileiros e todos os militares do Rio e seu entorno a ele totalmente
submetidos.
Destaque-se,
que ao menos parte da inércia militar do governo Ouro Preto durante o singular
confronto entre forças do mesmo exército se deveu a silenciosa e traiçoeira
atuação do Marechal Floriano Peixoto, então a segunda figura em importância no
Ministério da Guerra, e que no curso da repressão fazia o trabalho de chefe do
estado-maior, o qual embora do mesmo partido de Ouro Preto e por ele
recentemente promovido aquela patente, a partir de certo momento traiu
totalmente ao governo. Para isto, ele que até então o apoiava passou a manobrar a tudo de maneira a
esconder do primeiro-ministro Ouro Preto importantes dados, que já possuía e em
seguida a reduzir ao mínimo qualquer reação governamental a sedição, sem deixar
de mostrar solidariedade ao cabeça do governo, ao qual iludiu descaradamente,
só mostrando-lhe parte de sua face desleal nos últimos momentos, que
antecederam a queda do gabinete.
Isto
ocorreu, quando o primeiro-ministro
dentro do Q.G. queria que os canhões das tropas de Deodoro fossem tomados à
força de baionetas. "No Paraguai, os nossos soldados apoderaram-se da
artilharia em piores condições" , disse Ouro Preto a Floriano. "Sim,
mas as bocas no Paraguai eram inimigas, e aquelas que Vossa Excelência está
vendo são brasileiras, e eu sou, antes tudo, um soldado da nação." Foi
ali, que ele mostrou a sua verdadeira feição, que até então escondera com real
habilidade artística do crédulo e iludido Ouro Preto.
No
dia seguinte, D. Pedro II e familiares, foram oficialmente notificados a
deixarem o país, e estando politicamente desprestigiado e totalmente sem apoio
militar, o imperador e seus parentes se submeteram ao mesmo, deixando o Rio
para o exterior num velho navio de passageiros, o Alagoas, para na sua quase
totalidade nunca mais aqui retornar.
“A vista da representação escrita, que me foi entregue hoje, às 3 horas da tarde, resolvo, cedendo ao império das circunstâncias, partir, com toda a minha família, para a Europa, deixando esta Pátria, de nós tão estremecida, à qual me esforcei por dar constantes testemunhos de entranhado amor e dedicação, durante quase meio século em que desempenhei o cargo de chefe de Estado. Ausentando-me, pois, com todas as pessoas de minha família, conservarei do Brasil a mais saudosa lembrança, fazendo os mais ardentes votos por sua grandeza e prosperidade.
Rio de Janeiro, 16 de novembro de 1889.
D. Pedro de Alcântara.”
E
a população carioca como assimilou as grande novidades políticas então
ocorridas? Durante o decorrer do dia 15 de novembro, ao que se depreende, sem
saber o que realmente ocorrera e ignorando inclusive o que logo viria, até que
o povo comum as recebeu aparentemente bem, provavelmente satisfeito pela forte
humilhação sofrida pela nada popular classe política, consistente na truculenta
destituição do gabinete. Tanto que, naquele dia e até a noite muitas pessoas
desfilaram agrupados atrás de bandas de músicas militares, como então se fazia,
aparentemente felizes com o ocorrido.
E
o restante da população carioca como reagiu então e logo depois do golpe
militar? Para Aristides Lobo “o povo assistiu àquilo bestializado, atônito,
surpreso, sem conhecer o que significava. Muitos acreditaram seriamente estar
vendo uma parada!” (cf. artigo escrito
no dia 15, e publicado no "Diário Popular", de São
Paulo, em 18 de novembro de 1889). Note-se, que ele era partidário da república
e participou do primeiro ministério republicano, como titular da pasta do
Interior, aonde ficou só por pouco mais de
dois meses, face a profundas divergências com o Marechal Deodoro.
(desfile no R.J. com Deodoro à frente no dia 15 de novembro) |
O próprio antes referido Artur Azevedo sobre isto escreveu na imprensa:
E
a partida da Família Imperial foi objeto de manifestações populares pró ou
contra ela? O deposto D. Pedro e família deveriam ter partido no dia 17 de novembro, durante o
dia, mas saíram na madrugada deste dia, por imposição do governo provisório,
que alegou temer que estudantes iriam promover uma arruaça contra aqueles em
seu embarque diurno, havendo o risco deles serem “metralhados”, tal como narrou
Gastão de Orleans, que pareceu ter-se atemorizado com isto. Não é de se crer,
que civis tivessem acesso a metralhadoras, que já existiam, sendo elas grandes
e usadas em reparos instalados nos navios brasileiros de guerra, mas é claro
totalmente inacessíveis aqueles jovens, que nem saberiam como remonta-las e
usa-las numa área urbana. O que faz supor, que o governo não queria, é que
manifestantes populares ou da elite favoráveis a deposta Coroa fossem deles se
despedir afetuosamente.
FIM
BIBLIOGRAFIA
BUARQUE DE HOLANDA, Sérgio (org.); ELLIS, Myrian et al. HISTÓRIA GERAL DA CIVILIZAÇÃO BRASILEIRA. O BRASIL MONÁRQUICO: DECLÍNIO E QUEDA DO IMPÉRIO. Tomo II e seu 4.° volume. Rio de Janeiro: Editora Bertrand Brasil. Edição 1995.
FROTA, Guilherme de Andréa. 500 ANOS DE HISTÓRIA DO BRASIL. Rio de Janeiro: Biblioteca do Exército. Edição 2000.
SENA, Ernesto. DEODORO: SUBSÍDIOS PARA A HISTÓRIA. Brasília: Conselho Editorial do Senado Federal. Edição 1999.
SILVA, Hélio. 1889: A REPÚBLICA NÃO ESPEROU O AMANHECER. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira. Edição 1972.
SILVA, Ana Cláudia Suriani da. AS CRONIQUETAS DE ARTUR AZEVEDO. http://revistas.iel.unicamp.br/index.php/remate/article/viewFile/3799/3256 . Acesso em: 27/09/2014.
VEJA EDIÇÃO ESPECIAL: REPÚBLICA - 20/11/1889. http://veja.abril.com.br/historia/republica/indice.shtml . Acesso em: 28/09/2014.
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